DESEJO DE ME INCENDIAR

Nesta tarde de sol deixo entrar alguns raios deste astro que diante de mim me encandeia. E resta-me desejar que incendeie o meu blog nocturno:
Precipito-me para o meu carro, sinto a porta bater junto a mim... por instantes: silêncio... o sol já se prepara para o seu mergulho diário e vai-se despedindo de mim, deixando-me uma angústia no peito... abro as janelas... hoje não me apeteve ouvir música... vou sentir o vento na minha cara... ós meus genes nómadas conduzem-me para Oeste, para o mar... estou sentada no topo de uma falésia e apetecia-me apenas deixar-me embalar pelo entardecer... vai caindo... lentamente... (deixando em mim um misto de ansiedade e saudosismo)... de repente deixo de sentir o seu calor... o céu enche-se de chamas... mas nem sinais da bola de fogo... a tranquilidade instala-se... o vento é diferente... o som é diferente... e até o cheiro é diferente... uma calmia apodera-se da terra, numa espécie de lamento e alívio... e eu dirijo-me serenamente para o carro... ligo as luzes... ligo a música e agora resta-me conduzir serenamente para casa, dominada pelas luzes do entardecer... sigo a música e os flashes de lembranças de passado e de futuro... deixo-me ir...

I SHOULD BE A SURFER

Passo tanto tempo sem fazer estas viagens até ao oceano, que quando o faço sinto-me incapaz de conter esta vontade de me diluir em gota de água.
E quando o mar está como estava no último Sábado não posso evitar correr pela rebentação e andar como louca (não me assemelho em nada aos restantes transeuntes que saboreiam o mar). Ando descontroladamente, avanço e recuo com a rebentação como se a rebentação guiasse o meu compasso. Apetecia-me mergulhar, mas controlo esta tensão que me impele de navegar sem rumo e, depressa, num compasso fúnebre, regresso ao areal.
Os surfistas parecem-se lontras marinhas nos seus fatos pretos flutuantes, aguardando pela Onda Perfeita. Vêm-me à cabeça palavras como OFF-SHORE, SETS... cujo significado prático desconheço. Vejo-os caminhar alheios à realidade. Andam em bandos como se de aves se tratassem e seguem rigorosamente todos os rituais. Independentemente do impulso que os sustém de se atirar ao mar, caminham pela praia conscientes da sua superioridade moral e da convicção de fazerem parte de algo superior ao qual os restantes seres humanos (os que no momento caminham pela praia) se vêm excluidos. E é impossível ficar indiferente ao espectáculo que se desenrola diante dos nossos olhos.E na diversidade de seres humanos naufragados no areal distingo alguns exemplares: o grupo de brasileiros, que relaxadamente saboreiam a praia e a companhia dos seus; os dois casais de trintões que se matam a trabalhar para manter, pelo menos as aparências, como se a vida se resumisse apenas a isso, e que em curtos lapsos de tempo vêm despertar a sua humanidade no areal; o casal de “freaks” que infringindo todas as regras, desafiam o sol e até as marés e se banham indisciplinadamente com os seus filhotes (imunes a todas as espécies de doenças).

Por um longo espaço de tempo imagino-me invisível a caminhar descalça pela rebentação, levantando a saia para não a molhar (e é este gesto precisamente que me permite manter alguma sobriedade mental), quando sou abordada por uma estrangeira residente que me questiona se de certeza que sou portuguesa. (Fico para aqui a matutar o que a terá levado a contrário o contrário? Hum! Serei “ALIEN”?)